domingo, 6 de dezembro de 2015

O fechamento da Cosac Naify

                                   Crédito: Site da Cosac Naify
Detalhe de uma sala da editora, que fica na Vila Buarque

Dá uma dor no coração ver a Cosac Naify fechando as portas assim, dando adeus ao mercado, só porque o dono, parece, cansou de brincar de marchand dos livros. Parece ter sido isso, é o que dizem, com a facilidade tal como se abrem e fecham os olhos. Mas vi Charles Cosac na televisão se defendendo das acusações de que ele não tem o direito de fechar a editora desse modo. E ele se defende bem. Acho que fico com ele, apesar dos pesares. O dinheiro é dele, a vida é dele, o negócio é dele.

Ao longo desses quase vinte anos de produção, Charles Cosac investiu cerca de US$ 70 milhões na editora, que mudou a cara do mercado editorial brasileiro. Vi esse valor na imprensa, e não fiquei sabendo se o montante é o total de investimentos, junto com o bilionário Michael Naify, que mora em Nova, e era sócio de Charles, ou se era só a parte deste, conhecido pela imprensa como o milionário excêntrico de família sírio-libanesa que estudou artes em São Petersburgo, na Rússia, que também é colecionador e que decidiu aplicar sua grana em um projeto de editora por amor aos livros. Na imprensa também (Carta Capital) diz-se que a editora tem uma dívida de R$ 70 milhões.

Na Cosac Naify, tudo era diferente, das capas, às fonts empregadas, passando pela escolha dos títulos que seriam publicados, o cuidado com o papel, com as ilustrações, com a tradução, com a revisão. Começou em 1997 (sua breve história é contada no site da própria editora), publicando livros de arte, e terminou com um catálogo fabuloso e um grupo de autores que se destacavam, vencendo prêmios, como o São Paulo de Literatura, em que Estêvão Azevedo venceu com Tempo de espalhar pedras como o melhor livro do ano, cujo resultado foi divulgado no mesmo dia em que a editora anunciava seu fechamento, 30 de novembro.

Existem umas pendengas trabalhistas e sociais das quais Charles Cosac parece não querer fugir. Falou mui serenamente na televisão sobre sua decisão. Em entrevista ao programa Globo News Literatura, do canal Globo News, disse que não se trata de falência, nem de ser uma vítima direta da crise que assola o país.

Disse que vai fechar porque o projeto inicial está sofrendo ameaça de alterações pelas circunstâncias do mercado, e que não quer que isso aconteça. O dólar está alto, e por isso não pode mais imprimir na China na qualidade que o projeto editorial requer. As gráficas no Brasil encareceram demais. As livrarias só aceitam vender por consignação, não compram mais livros, e só pagam a parte da editora 90 dias após as vendas dos livros nas lojas.

Mas Lucia Riff, a agente literária mais influente do mercado editorial brasileiro, que já foi sócia inclusive da lendária Carmen Balcells (que agenciou nomes como García Márquez e Vargas Llosa), não se convenceu das explicações de Charles Cosac. Ficou mais que decepcionada, ficou brava e foi dura. No mesmo programa Globo News Literatura, disse que Charles Cosac não tem o direito de fazer isso.

Mesmo que cumpra com seus compromissos trabalhistas com os cerca de 80 funcionários da casa, diz Riff, ainda há os contratos para  publicação de novos títulos. Neste caso, o empresário vai deixar os autores na mão. É claro que é a opinião dela. Não se sabe que articulação no mercado Charles Cosac vai fazer para não deixar seus autores com publicações previstas na mão, mas é uma possibilidade e uma dura realidade que está sempre prevista de ocorrer no Brasil.

O fato é que, em um momento de fragilidade pela qual o país passa com tantas desgraças mais avassaladoras do que o fechamento de uma editora, os leitores e amantes de livros de modo geral estão tristes com esta notícia. É como se alguém tivesse sentindo uma dor no corpo terrível, em função de um acidente ou uma doença, e aí, o tempo fecha, outrem diz “vai chover”, e este alguém desaba no choro.

Não há uma data específica para o desaparecimento dos livros nas livrarias. Mas o trabalho de edição, segundo o empresário, já está encerrado, com a exceção do de alguns títulos em finalização. No site da editora, há um anúncio de desconto de 20% sobre qualquer título.


Tenho vários livros com o selo Cosac Naify. Fico triste também com esta notícia. Mas como diz um ditado em espanhol, talvez argentino, que aprendi com uma certa escritora brasileira do Sul: “Llovió, pasó!”

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